14/10/2015

Obra: O Ateneu - Raul Pompeia

O Ateneu 



  • Enredo:

Após a entrada de Sérgio no Ateneu, o local é apresentado de forma minuciosa e estilizada. Há abundância descritiva de detalhes. O narrador se atém a cada episódio, buscando na memória o fio condutor da narrativa. Tudo isso amparado por metáforas e comparações, o que garante uma prosa formalmente hiperbólica, com tom de grandeza, como se o estilo elevasse aquele mundo por meio da linguagem. Assim, a cada episódio são descritos os colegas, os desafetos, os baderneiros, os protetores, os professores, Ema e, principalmente, Aristarco.

As relações entre esses personagens, no relato de Sérgio, formam o Ateneu. Esse, por sua vez, como em O Cortiço, de Aluísio de Azevedo, funciona na estrutura do livro como personagem. Essa é mais uma das singularidades do romance em relação ao que prescrevia a estética naturalista, para a qual o meio se sobrepunha sempre ao indivíduo, determinando-o, como no caso do citado romance de Aluísio de Azevedo. Em O Ateneu, isso quase sempre ocorre, mas, na caracterização formal que envolve Aristarco e o Ateneu num mesmo grupo de características, o meio e o indivíduo se identificam. Isso torna as forças de determinação do meio quase nulas, colocando em ação a determinação estrutural edificada pelo poder – como acontece na hierarquia institucional, nas relações de trabalho e nas relações sociais.

Aristarco é construído no mesmo processo. Ambos – a escola e seu diretor – são abordados de maneira grandiloqüente, nas comparações com vultos da Antiguidade clássica, deuses e monumentos sacros. No entanto, essa construção mascara um lado torpe. Por baixo da carapaça de uma instituição educacional de renome, há o pior dos mundos, retratado em relações homossexuais degradadas, nas quais os mais fortes subjugam os menores.
Aristarco é visto, inicialmente, como um pedagogo-modelo. Essa imagem, no entanto, como a do próprio internato, não passa de fachada. O diretor é conivente com o ambiente mórbido das relações entre alunos e professores. Tome-se, por exemplo, o caso de Franco, um dos internos, personagem que encarna o aspecto mais doentio do colégio. Abandonado pela família, serve como bode expiatório para Aristarco.
Aristarco e o Ateneu se determinam um em função do outro, tanto no processo de sua construção como na desconstrução, quando tragicamente um interno ateia fogo ao colégio. Ema, esposa de Aristarco, aproveita o momento para fugir e abandonar o marido.


  • Personagens principais e secundárias do livro:

Sérgio: personagem principal. Entra aos 11 anos no internato Ateneu e ali tem várias experiências que são narradas no livro. 


Aristarco: diretor do colégio e pedagogo reconhecido por suas obras. Ao mesmo tempo em que é rígido, possui uma alma paternal. 

D. Ema: esposa de Aristarco. Sérgio nutre um amor platônico por ela. 

Professor Mânlio: Primeiro professor de Sérgio. 

Rebelo: primeiro amigo de Sérgio. É bondoso e um ótimo aluno. Ajudou Sérgio nas lições. 

Sanches: à primeira vista, é considerado antipático por Sérgio, salva ele de um afogamento e os dois tornam-se amigos. 


Barbalho: aluno indisciplinado com quem Sérgio tem uma briga. 


Ribas: menino feio, que cantava músicas religiosas singelamente. 


Ângela: funcionária espanhola do colégio. Moça bonita desejada por todos. 


Egbert: considerado o único amigo verdadeiro de Sérgio, que o admirava pela sua beleza. 


Bento Alves: bibliotecário com quem Sérgio teve uma íntima amizade. Sai do colégio por uma briga que teve com o Sérgio. 

Américo: aluno que entra no colégio obrigado pelo pai e que provavelmente é o responsável pelo início do incêndio.


  • Temas da obra:
De acordo com os preceitos do romance naturalista, ao qual se pode associar o livro, depreende-se em O Ateneu uma crítica feroz às instituições de ensino das elites do século XIX. O colégio é visto como microcosmo da sociedade. Para isso, o narrador utiliza descrições de toda ordem, físicas ou psicológicas, levadas a cabo com rigor e riqueza de detalhes quase científicos.



“Aqui suspendo a crônica das saudades. Saudades verdadeiramente? Pura recordações, saudades talvez se ponderarmos que o tempo é a ocasião passageira dos fatos, mas sobretudo – o funeral para sempre das horas.” 



  • Contexto histórico:

O século XIX foi marcado pela falsa estruturação do sistema educacional brasileiro, principalmente dos colégios internos frequentados pelos filhos da elite. Internatos onde a educação era impregnada de modelos severos e regimes autoritários, onde a educação moral rígida era vista como objetivo final da escola.
  • Verossimilhança:

Em vários trechos da obra há uma crítica em relação às escolas, o que não é muito diferente do que ocorre nas escolas de hoje. está presente em vários trechos da obra. O crescimento físico acompanha o acúmulo de experiências empíricas e outras que proporcionam um crescimento moral em todo indivíduo. E soma-se a isso a atribuição de responsabilidades,direitos e deveres que aumentam a auto-estima do sujeito pelas funções que assume perante a sociedade e pela confiança que a sociedade deposita nele. "Mas um movimento animou-me, primeiro estímulo sério da vaidade: distanciava-me da comunhão da família! Ia por minha conta empenhar a luta dos merecimentos: e a confiança nas próprias forças sobrava. Quando me disseram que estava a escolha feita para casa da educação que me devia receber, a notícia veio achar-me em armas para a conquista audaciosa do desconhecido.
  • Foco Narrativo:

É uma narrativa de confissão, narrada em 1ª pessoa por Sérgio (personagem-narrador). A obra é memorialista, seu narrador, Sérgio, apresenta suas memórias de infância e adolescência num colégio interno chamado Ateneu. Assim, o foco narrativo em primeira pessoa impede a tão valorizada objetividade e imparcialidade do Realismo-Naturalismo.Sérgio é o alter-ego, ou seja, um outro “eu” de Raul Pompéia. Em outras palavras, o narrador recebe a personalidade e também as memórias do autor, já que este também estudou num internato, o Colégio Abílio, do Rio de Janeiro.

  • Tempo:
O tempo cronológico não supera dois anos, que vão desde a entrada de Sérgio no colégio até o incêndio que o destrói totalmente, por volta da última década do séc. XIX . Predomina, assim, o chamado tempo psicológico por ser um romance de memória em que fatos e pessoas vêm a tona da consciência conforme sua importância no momento da narração. Esta é feita basicamente por meio de flash back, tornando visível o que era invisível, porém, de forma bastante tênue, sem intensidade, marcada apenas pela impressão sensorial. 
  • Espaço da narrativa:
O colégio localizava-se na cidade do Rio de Janeiro. "O Ateneu, quarenta janelas, resplendentes do gás interior, dava-se ares de encantamento com a iluminação de fora..." Figurativamente podemos enquadrá-lo entre dois mundos: a família e a sociedade. 

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